Da mobilidade da alma comparada a uma pena



Por São João Cassiano

Não é sem razão que se compara o modo de ser da alma a uma pena ou a uma asa muito leve. Esta, se não for manchada ou impregnada pela corrupção de qualquer líquido vindo de fora, com a ajuda de uma levíssima aragem, dada a mobilidade de sua própria natureza, como que naturalmente, eleva-se às alturas celestes. Mas, se ao contrário, se tornar pesada pela aspersão ou infusão de qualquer líquido, não somente não será arrebatada  nos seus voos aéreos pela sua natural mobilidade, mas até será arrastada para o interior da terra pelo peso líquido absorvido. Assim também, a nossa alma, se não se tornar pesada pelos vícios vindos do exterior ou pelas preocupações do mundo, ou não for manchada pelo líquido nocivo da sensualidade, como que levantada pelo atributo natural da sua pureza, elevar-se-à, ao mais leve sopro da meditação espiritual, para as alturas e, abandonando as coisas caducas e terrenas, transportar-se-à para as celestes e invisíveis. Por isso, somos muito particularmente advertidos pelas palavras do nosso Senhor: "Tende cuidado para que os vossos corações não se tornem pesados pela orgia, pela embriagues e pelas preocupações da vida presente" (Lc 21,34). Portanto, se queremos que as nossas orações penetrem não só nos céus mas para além dos céus, esforcemo-nos por reconduzir a nossa alma, expurgada de todos os vícios terrenos e purificada de todos os resíduos das paixões, à sua sutileza natural, de modo que sua oração, assim liberta de todo o peso morto dos vícios, suba a Deus.


(in Da Oração. Editora Vozes, p. 18)

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