A finalidade dos sacramentos e da prece.

Por Domingos Pardal Braz

Uma das mazelas de nossa condição humana é abusar de tudo quanto é bom e pelo abuso converter o bem em mal.

Inverter a ordem divina e utilizar-se pessimamente das coisas santas, profanando-as.

Sabendo que haveria de abandonar corporalmente este mundo e passar a outra esfera Nosso abençoado Salvador e Mestre achou por bem relacionar a ministração de sua divina graça a alguns sinais sensiveis.

Assim, como sua personalidade divina foi sucedida pela personalidade do Consolador seu vigário, sua natureza humana, sacramento de nossa restauração, foi substituida por sete ritos visiveis aos quais os teóforos apóstolos deram o nome de mistérios e que os latinos traduziram por sacramentos.

Cada um destes sinais produtores da graça divina está diretamente relacionado com im mistério de Nossa elevação e com uma faze de nossa peregrinação terrestre. Tal a incomensurável sabedoria de nosso bom pedagogo.

O Batismo tem sua origem na água que brotou do lado do Senhor ao ser aberto pela lança do centurião, foi profetizado pela travessia do mar vermelho pelos hebreus e antecipado pelo ministério de João porque a água significa pureza e representa a purificação de nossas almas.

Ele é a nova circuncisão e a porta de entrada da igreja por isso que as congregações plantadas pelos ministros oculares da palavra permitiram que os meninos fossem batizados e entrassem neste novo pacto tão superior ao Velho como os céus a terra.

A unção do óleo foi estabelecida com o objetivo de exaltar o Título maior de nosso divino Mestre: Kristós que quer dizer ungido, ungido com o óleo, com o óleo da alegria. Ela foi profetizada pelas diversas unções estabecidas pelo legislador hebreu.

Ela é destinada a iniciação dos jovens pois significa um aprofundamento na amizade divina e um alento da consciência espiritual concedido ao homem nessa fase tão conturbada de sua existência na qual pululam as paixões.

A eucaristia foi estabelecida para que possamos saborear a carne e o sangue imolados na ara da cruz e obter a vida que contem. Foi profetizada pelo sacríficio de pão e vinho oferecidos a Deus por Melquizedek rei de Salém, por isso que o sacerdócio de Cristo não procede de Aarão - pois não sancionou a imolação de animais inocentes - mas de Melquizedek.

Ela tem por fim conduzir o homem a maturidade espiritual e a plenitude em Cristo. Da mesma maneira que as palavras do Evangelho ela nutre as nossas almas e lhas fortalece cada vez mais no bem e na virtude.

A Penitência foi estabelecida para que os pecados continuem a ser publicamente remitidos pela igreja tal e qual o foram por seu esposo e fiador Nosso Senhor Jesus Cristo. Pois aquele que pode perdoar também pode conceder aos outros tal faculdade. Não há tipo deste sacramento na lei judaica porque a ela não fora concedida grala tão sublime.

Ele tem por fim ordenar as reparações e penitências concernentes aos pecados e reconciliar os penitentes com o Senhor.

O matrimônio é um grande sacramento pois simboliza a união da natureza divina com o gênero humano ou com a igreja, conforme a encarnação de Cristo. Ele foi representado pelos cantares de Salomão através dos quais o Espírito de profecia cerebra as bodas de Cristo com a Igreja uma esposa sem mancha ou ruga, a igreja, a um tempo Virgem e Mãe do mesmo modo que Maria Santíssima.

Ele tem por fim comunicar aos conjuges todos os auxilios espirituais necessários ao cumprimento de seus deveres de estado concernentes a fidelidade mútua e a educação dos rebentos.

A Eukelaion representa a agonia do Senhor e dela não pode haver memória na antiga lei porquanto os hebreus não possuiam idéias suficientemente claras sobre o além túmulo. Ela esta relacionada com todas a cura da filha de Jairo e do menino epilético.

Não presta para cura do corpo, mas para a consolação da alma prestes a abandonar este mundo. É pois uma preparação para o mundo futuro tendo em vista evitar o cárcere e alcançar uma boa ressurreição no último dia.

A ordem está pautada no sacerdócio de Cristo e na administração destes mistérios. É pois um prolongamento do único sacerdócio e raiz de toda graça. É profetizada pelas unções e gestos com que os hebreus constituiam seus sacrificadores e constitui aquele que lha recebe em vigário dos santos apóstolos e comendador do Senhor Jesus Cristo, posto como mordomo de sua casa que é a igreja.

Há que mencionar outros dois ritos que embora não produzam a graça não deixam de concorrer para seu aumento e para instrução dos santos.

Refiro-me ao lavamento dos pés ainda hoje ministrado pelos coptas, assirios e mantido por algumas ordens monásticas. Ele significa que os cristãos são todos iguais, todos irmãos e que se devem servir uns aos outros com espírito de acendrada humildade.

E ao ritual do enterro, este foi representado pelo apocalipse de Baruc até hoje utilizado pela igreja de Edessa e tipificado pelo féretro de nosso augusto reparador e pela lavagem de seus pés pela egrégia mirófora. Por isso o santíssimo Efraim disse: acompanha todos os sepultamentos e chora com os que nele choram e Atanásio 'pílar da confisão nicena': Aquele que entoa preces e acende luzes sobre os túmulos dos servos de Deus, grangeia méritos para sí.

Jamais poderemos aquilatar o que significa a instituição destes mistérios e a idéia que sobre esles fazemos é demasiado pálida e obscura, mas sabemos que não foram estabelecidos como fim em si mesmos e que não santificam a quem quer que seja antes predispõe a todos para que se santifiquem.

Nem ser batizado, nem ser Crismado ou fazer a páscoa, ou ser ordenado confere algum merecimento.

É a resistência ao mal e a obediência aos mandamentos de Jesus Cristo que nos santificam e não os sacramentos. Os sacramentos foram estatuidos não como ritos mágicos mas como instrumentos que nos permitem imitar a conduta de Cristo, de sua mãe, dos apóstolos, mártires e Padres e consumar a salvação com tremor e temor.

Engana-se a si mesmo aquele que crê salvar-se por comungar do Cristo, imolado sobre o altar enquanto dá as costas ao mesmo Cristo presente no miserável e no oprimido que lhe implora socorro. Pois a comunhão existe justamente para unir fortemente uns aos outros os membros do Senhor pelos laços inquebrataveis da caridade fraterna.

Ninguem creio poder ir muito longe apenas por receber os sacrementos com assiduidade pois os sacramentos não foram estabelecidos como veículos e sim como combustíveis espirituais. Recebe-mo-los para poder atuar no mundo e transforma-lo, a exemplo do Senhor Jesus Cristo.

Os sacramentos não existem para que neles repousemos ou descancemos das obras, mas para que lhas pratiquemos com mais empenho. Os mistérios não foram estatuidos para diminuir a caridade e a misericórdia mas para expandi-las sobre a terra, são por assim dizer fundamentos do paraíso mas te-mo-los convertido em alicerces do inferno.

O mesmo se sucede com a prece.

Quantos e quantos não fizeram dela um fim em sí mesmo e o supremo objeto de suas existências.

Mas o Cristianismo não conhece qualquer outro fim além do amor ao próximo e do serviço fraterno de modo que a prece também não passa dum instrumental, duma fonte de energias espirituais que Cristo poz a nossa disposição para que sejamos capazes de imitar seus exemplos e viver como ele viveu.

Pois o Cristianismo é antes de tudo um constante assimilar do cárater de Nosso Senhor jesus Cristo e um continuo plágio de suas ações e operações em nossas vidas.

Para que possamos honrar verdadeiramente nosso supremo môdelo e exemplo os sinais e a prece foram regulados.

Guardemo-nos pois de rezar por rezar multiplicando palavras e buscando bens materiais e caducos!!!

Oremos antes de tudo mentalmente, considerando os mistérios de nossa redenção e meditando sobre a oração dominical e sobretudo com nossas boas obras fazendo de nossas vidas as mais belas orações. Sejamos orações vivas dedicadas ao Verbo eterno de Deus.

Recebamos os sacramentos com assiduidade mas não como os pagãos que depositam suas esperanças em fórmulas e gestos. Recebamos os sacramentos da vida para a vida, para que Cristo viva em nossos corações, para que Cristo cresça em nossas almas e para que atue no mundo através de nós fazendo bem a todas as criaturas vivas e afastando-se do mal.

Honremos os santos mistérios como fontes da graça divina, não enterremos nossos talentos como fez o servo infiel, mas como servos fiéis aplique-mo-los e faça-mo-los render para a eternidade.

Juntemos nossos tesouros no céu fazendo bom uso dos mistérios em nossa vida cotidiana.

Pois onde está nosso tesouro, lá estará o nosso coração.

Kristós anésti nekros.

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