Conversando sobre Direitos Humanos...


Estive hoje com alguns irmãos anglicanos em um grupo de estudos discutindo um pouco a questão acerca dos Direitos Humanos.

Após uma devocional acerca do texto da mulher samaritana que dialogou com Jesus, começamos a conversar acerca do tema.

Quando falamos sobre tal assunto, lembro-me das minhas aulas de Direito, quando estudei um pouco acerca dos direitos humanos em diversas gerações.

Costumamos a aprender que os Direitos Humanos de primeira geração foram as liberdades, os direitos individuais, cujo marco foi a Declaração Universal dos direitos do homem e do cidadão. Era uma reação ao Estado feudal em que o ser deixava agora de ser servo para ser cidadão, não somente com obrigações, mas também com direitos. Criara-se, pelo menos no campo intelectual uma esfera de direitos subjetivos do qual o estado não poderia se intrometer. A independência dos EUA, a revolução Gloriosa espelham um pouco tal época.

Entretanto, alguns foram percebendo que garantir somente os direitos individuais não permitiam uma boa vivência em sociedade. Com a crítica socialista, vieram os Direitos Humanos de segunda geração. Dizia respeito aos direitos sociais, refletindo-se no Direito do Trabalho, Previdenciário, no Estado de Bem Estar Social. Tal conceito, alguns dizem, está caindo em declínio devido a própria falência do Estado. Entretanto, vemos que mesmo no campo legislativo tem havido uma esfera menor para a atitude individual pois o estado tem reconhecido a existência do hipossuficiente que necessita de uma tutela especial, como por exemplo, o consumidor, ou a limitação da propriedade privada à sua função social.

Mas somente viver em sociedade e ter os direitos sociais garantidos não resolve. Não resolve, principalmente se esgotarmos todos os recursos dos quais tivermos disponíveis. Daí, muitos falarem em Direitos Humanos de terceira geração, em que estaria incluída a proteção ao meio ambiente, um sonho de tornar novamente a terra habitável. Hoje, já se fala em Direitos Humanos de quarta geração, que diz respeito ao direito à informação e a biogenética.

Enfim, direitos à parte, fato é que, tal classificação só tem fins didáticos. Muitos destes direitos ocorrem ou são violados concomitantemente. No Brasil, em algumas localidades, se tem a impressão de que não chegamos nem nos direitos de primeira geração, pois o indivíduo é muitíssimo pequeno diante do Estado...

Nosso amigo Mateus, dominicano, um dos participantes do grupo, mencionou o último plano de diretrizes acerca dos Direitos Humanos que o governo Lula tentou lançar, mas que sofreu um série de críticas da sociedade, principalmente de juristas famosos como o Yves Grandra. Entre outras críticas, a questão acerca do controle da mídia, do aborto, entre outros foram alvos de protesto. Ele, nosso amigo, sugere que o estudemos com mais calma.

Após falar sobre todos estes assuntos, fato é que, ao final, dá uma certa sensação de impotência. Há muitos direitos já garantidos em legislação, mas de modo algum cumpridos. Marx dizia que os documentos legais da sociedade burguesa pareciam equivaler a documentos teológicos, pois nunca se cumprem de fato. Bastar ler por exemplo, os cinco primeiros artigos de nossa constituição, dos direitos e garantias individuais. Muito lindos, muito belos, mas que não se cumprem na prática; daí, parte da doutrina dizer que é uma espécie de carta de intenções e não direitos subjetivamente já garantidos...

Ver a situação de presos em delegacias como a mídia noticiou semana passada, a situação nas filas dos hospitais, o aumento da população de rua... Um dos participantes, professor de ensino médio, nosso amigo Reginaldo, constatar que seu aluno, maior de idade, é um analfabeto funcional pois mal consegue ler um texto, e perceber que esta é a condição da maior parte dos alunos de periferia... Enfim, dá uma sensação de impotência difícil de superar.

Esta é a questão. Como fazer com que os tais direitos humanos sejam efetivamente colocados em prática por aqui? Somos pequenos demais, e, tudo o que temos parece, são nossas atitudes individuais, que embora louváveis, não são suficientes para por fim às injustiças. Os abolicionistas compravam homem por homem e lhe davam liberdade, mas isso, nao obstante ser muito importante e essencial, ainda assim não resolveria o problema todo se a própria estrutura escravagista não fosse mudada.

Que o Senhor nos ajude a ver o Cristo na face do pobre, do nu, do faminto, do encarcerado, pois, como ensinou Bonhoeffer, é na face do outro que vemos a transfiguração da presença de Cristo, a presença real daquele que sofre na face do oprimido.

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