A doutrina da salvação por fé sem as obras da lei é anti-judaica?
Por Carlos Seino

Todos os cristãos, principalmente nós, os evagélicos, já ouvimos falar que "Cristo é o fim da lei para todo o que crê", conforme preconizado na epístola de Paulo aos romanos, por exemplo.
Também estamos acostumados a ouvir pregações e estudos acerca da controvérsia de Paulo com os judaizantes de seu tempo, que queriam circuncidar os cristãos gentios.
A luz destas coisas, não foram poucos os que apontaram a doutrina paulina, reavivada pelo protestatismo, como anti-judaica, tendo em vista entendermos Jesus como o fim, o término da lei.
Para um judeu, que amava a tradição de seus pais, por entenderem recebidos os preceitos da lei das mãos do próprio Deus, realmente, parecia uma coisa um tanto quanto dramática de se aceitar, e não poucos teólogos judaicos expuseram suas críticas a tal doutrina cristã. Chegam até a dizer que foram os cristãos posteriores que interpretaram Jesus de uma maneira nova, visto que, o cristianismo é a única religião em que seu fundador pertecera completamente a outra religião.
Por isso, muitos, hoje em dia, têm sugerido a interpretação da frase paulina como Jesus sendo, não o término da lei, mas sim o "telos", a finalidade da lei (no grego, "telos" realmente pode assumir este sentido).
Assim, Jesus não seria, a luz do ensino de Paulo, o fim da lei no sentido de término, mas sim a "finalidade" da lei, no sentido de ser o algo, ou alguém para quem a lei aponta.
Paulo disse, ao escrever aos Gálatas, que a lei foi o pedagogo que conduziu todos a Cristo. Chegou até a dizer que, de modo algum se abandova a lei, mas que ela estava estabelecida. Ensinou que a lei demonstrava o real estado do homem quando ao tentar cumprir todos os preceitos da lei, a ponto de dizer: "miserável homem que sou", demonstrando assim, a enfermidade de sua carne. Com a mente, confessava o apóstolo, ele sabe que a lei é santa, e o mandamento, justo e bom, mas que encontrava em seus membros uma outra lei que o governava. Chegava a conclusão de que ninguém conseguiria, por toda a sua vida, cumprir todos os preceitos da lei, e, ainda que o fizesse exteriormente, sabia que, no interior, os impulsos eram outros.
Também aos gentios, não deu outra escapatória. Disse que, mesmo estes, os gentios, tinham a lei gravada em seus corações, e que muitos deles a viviam de forma muito mais autêntica e aceitável a Deus do que muitos judeus; entretanto, que nem mesmo o gentio conseguia viver totalmente de acordo com sua consciência. É como se cada pessoa fosse convidada a colcoar em um papel (ou, para sermos mais modernos, gravasse) tudo o que entende ser correto em matéria de ética, de moral, e de comportamento, e no final de sua vida, fosse analisado de acordo com todos os princípios que le mesmo entendia serem corretos. Ao se fazer tal análise, sempre perceberá que ficou muito aquém do seu próprio sistema moral. Ou seja, cada ser humano fica muito aquèm, em uma última análise, daquilo que julga ser correto, não somente no sentido a não cometer atos faltosos, mas também no sentido de se não cumprir tudo o quanto entende ser justo e correto.
Daí, Paulo, ao citar o salmista, ensinou que "não há um justo, nem um sequer, todos pecaram e se fizeram inúteis".
Neste sentido, toda a argumentação do apóstolo dos gentios se dá no sentido da lei, seja escrita (judeu), seja interior (gentio), apontar, em primeiro lugar, o próprio estado de incompletude que se encontra todo o ser humano, e em segundo lugar, a própria necessidade de um salvador.
Daí, dizer que a lei foi o pedagogo, ou o mestre que nos levava a Cristo, pois, segundo a teologia neotestamentária, ele, Cristo, cumpriu cabalmente toda a lei, não pecando, nem violando-a em nenhum preceito.
E o autor da epístola aos hebreus, magistralmente, argumentou que sangue de animais em sentido nenhum podem purificar homens pecadores...
Daí, a fé passa a ser vista não como mero assentimento a um conjunto de doutrinas e dogmas, mas como pura confiança em Cristo.
Basta que cada qual faça uma reflexão sobre si mesmo, uma meditação no próprio interior... Não há quem não faça tal reflexão, e, auxiliado por Deus, não admita o seu próprio estado de imperfeição.
Ou seja, não é um olhar para as estrelas, para o céu, para o abstrato, que fará o ser chegar-se a Cristo; mas sim um olhar para si mesmo.
Por isso, Bultmann ensinou que, o falar sobre Deus é sempre um falar sobre o homem e vice versa. Toda a teologia é antropologia, e toda antropologia é teologia.
Aí, talvez possamos entender o porque de muitos ensinarem, diferente daquilo que ensinaram os mais radicais protestantes, de que Cristo era o término da lei, mas sim, que, em certo sentido, Cristo era a finalidade da lei. Daí, Paulo não poder ser acusado de ser um anti-judaizante.
Mas qual o motivo, afinal, da controvérsia paulina contra os judeus, controvérsia esta que sempre acaba por se instaurar na discussão lei e fé, ou fé e obras?
É o que continuaremos a meditar em uma próxima oportunidade.

Todos os cristãos, principalmente nós, os evagélicos, já ouvimos falar que "Cristo é o fim da lei para todo o que crê", conforme preconizado na epístola de Paulo aos romanos, por exemplo.
Também estamos acostumados a ouvir pregações e estudos acerca da controvérsia de Paulo com os judaizantes de seu tempo, que queriam circuncidar os cristãos gentios.
A luz destas coisas, não foram poucos os que apontaram a doutrina paulina, reavivada pelo protestatismo, como anti-judaica, tendo em vista entendermos Jesus como o fim, o término da lei.
Para um judeu, que amava a tradição de seus pais, por entenderem recebidos os preceitos da lei das mãos do próprio Deus, realmente, parecia uma coisa um tanto quanto dramática de se aceitar, e não poucos teólogos judaicos expuseram suas críticas a tal doutrina cristã. Chegam até a dizer que foram os cristãos posteriores que interpretaram Jesus de uma maneira nova, visto que, o cristianismo é a única religião em que seu fundador pertecera completamente a outra religião.
Por isso, muitos, hoje em dia, têm sugerido a interpretação da frase paulina como Jesus sendo, não o término da lei, mas sim o "telos", a finalidade da lei (no grego, "telos" realmente pode assumir este sentido).
Assim, Jesus não seria, a luz do ensino de Paulo, o fim da lei no sentido de término, mas sim a "finalidade" da lei, no sentido de ser o algo, ou alguém para quem a lei aponta.
Paulo disse, ao escrever aos Gálatas, que a lei foi o pedagogo que conduziu todos a Cristo. Chegou até a dizer que, de modo algum se abandova a lei, mas que ela estava estabelecida. Ensinou que a lei demonstrava o real estado do homem quando ao tentar cumprir todos os preceitos da lei, a ponto de dizer: "miserável homem que sou", demonstrando assim, a enfermidade de sua carne. Com a mente, confessava o apóstolo, ele sabe que a lei é santa, e o mandamento, justo e bom, mas que encontrava em seus membros uma outra lei que o governava. Chegava a conclusão de que ninguém conseguiria, por toda a sua vida, cumprir todos os preceitos da lei, e, ainda que o fizesse exteriormente, sabia que, no interior, os impulsos eram outros.
Também aos gentios, não deu outra escapatória. Disse que, mesmo estes, os gentios, tinham a lei gravada em seus corações, e que muitos deles a viviam de forma muito mais autêntica e aceitável a Deus do que muitos judeus; entretanto, que nem mesmo o gentio conseguia viver totalmente de acordo com sua consciência. É como se cada pessoa fosse convidada a colcoar em um papel (ou, para sermos mais modernos, gravasse) tudo o que entende ser correto em matéria de ética, de moral, e de comportamento, e no final de sua vida, fosse analisado de acordo com todos os princípios que le mesmo entendia serem corretos. Ao se fazer tal análise, sempre perceberá que ficou muito aquém do seu próprio sistema moral. Ou seja, cada ser humano fica muito aquèm, em uma última análise, daquilo que julga ser correto, não somente no sentido a não cometer atos faltosos, mas também no sentido de se não cumprir tudo o quanto entende ser justo e correto.
Daí, Paulo, ao citar o salmista, ensinou que "não há um justo, nem um sequer, todos pecaram e se fizeram inúteis".
Neste sentido, toda a argumentação do apóstolo dos gentios se dá no sentido da lei, seja escrita (judeu), seja interior (gentio), apontar, em primeiro lugar, o próprio estado de incompletude que se encontra todo o ser humano, e em segundo lugar, a própria necessidade de um salvador.
Daí, dizer que a lei foi o pedagogo, ou o mestre que nos levava a Cristo, pois, segundo a teologia neotestamentária, ele, Cristo, cumpriu cabalmente toda a lei, não pecando, nem violando-a em nenhum preceito.
E o autor da epístola aos hebreus, magistralmente, argumentou que sangue de animais em sentido nenhum podem purificar homens pecadores...
Daí, a fé passa a ser vista não como mero assentimento a um conjunto de doutrinas e dogmas, mas como pura confiança em Cristo.
Basta que cada qual faça uma reflexão sobre si mesmo, uma meditação no próprio interior... Não há quem não faça tal reflexão, e, auxiliado por Deus, não admita o seu próprio estado de imperfeição.
Ou seja, não é um olhar para as estrelas, para o céu, para o abstrato, que fará o ser chegar-se a Cristo; mas sim um olhar para si mesmo.
Por isso, Bultmann ensinou que, o falar sobre Deus é sempre um falar sobre o homem e vice versa. Toda a teologia é antropologia, e toda antropologia é teologia.
Aí, talvez possamos entender o porque de muitos ensinarem, diferente daquilo que ensinaram os mais radicais protestantes, de que Cristo era o término da lei, mas sim, que, em certo sentido, Cristo era a finalidade da lei. Daí, Paulo não poder ser acusado de ser um anti-judaizante.
Mas qual o motivo, afinal, da controvérsia paulina contra os judeus, controvérsia esta que sempre acaba por se instaurar na discussão lei e fé, ou fé e obras?
É o que continuaremos a meditar em uma próxima oportunidade.
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